Rabiscados & escritos

Não fugimos à regra em declarar um amor mútuo através de bilhetes, declarações, cartas e bilhetinhos, abertos na rede ou entre nós mesmos. Manuscritos e entregues juntos com presentes ou puros mesmo.

A cada vez que os lemos, viajamos nos momentos em que foram escritos e nos emocionamos novamente. E, como fica difícil encontrá-los neste torvelinho de mídias, resolvemos publicar alguns aqui para facilitar nossa troca de carinhos.

06 de maio - Aniversário da Cora

Por Rose:

Corinha, ainda não é dia 06 para nós, mas como não posso lhe dar um abraço, quero que as palavras cheguem ainda no seu amanhecer. Cora, Corinha como é bom tê-la comigo, tê-la para mim!

Aniversário: envelhecer, amadurecer, compreender, estender o tempo em busca de dias complacentes, daqueles que acordamos e nos amamos ou nos detestamos, mas sentimos a vida vibrar. Mulheres passam seus perrengues, temos que lutar muito para nos impormos, mas aprendemos rápido como gritar, como esbravejar, como se irritar. E você se tornou uma maestrina nessa empreitada. Desde cedo foi independente, não aceitava que lhe déssemos a comida na boca, pegava com as próprias mãos, tirava suas fraldas, não as suportando mais.

Uma menina com originalidade, que até seu primeiro aninho, me absorveu na atenção, no amor, na admiração, que me envolveu em uma confusão mental. Em que me resignava em seus quereres pela doçura em seu olhar, pelo seu apego a mim, pela sua preferência por mim. Te amamentava por 8 horas em viagens para lhe manter calma, ficando com os peitos em mulambos embalados por uma ternura e paciência que mesmo aos avessos, são momentos que me trazem deliciosas recordações.

E aí você foi crescendo, sempre com um despertar alegre, em movimento, esperta, dançava, adorava o Ióri, que também tinha muito carinho por você, te adorando também. Depois veio a época de reajustes, apertos de parafusos, por sua ambiciosa necessidade de transgressão, trazendo aprendizado para todos nós.

Você veio muito próxima do Ióri, dois anos depois, veio a menininha de olhos sentimentais, que derramava lagrimas espontâneas no canto de parabéns de um aninho. Me equilibrei para dar atenção, carinho, cuidado e muito amor aos dois. Lhe ajudar a ser uma mulher que não se submeteria em momento algum, de forma alguma, em ser diminuída em relação ao homem ou a qualquer outra pessoa, isto porque as famílias, as escolas, os amigos eram todos parte de uma sociedade machista.

Você está crescendo com respeito, dignidade e liberdade, são 32 anos de uma vida bela, 32 anos em que me lambuzo com seu amor, carinho, atenção. Receber suas ligações em horários inesperados, me banham a alma, me conectam em sua existência na forma de pertencimento. Como eu te amo Cora, meu coração fica com a pulsação forte, a garganta seca, os olhos marejam e a saudade aperta.

Outros anos virão, e com eles mais sabedoria, realizações, algumas tristezas, mas com certeza muito mais alegria. Que fiquemos próximas e conectadas apesar da distância física, que eu possa continuar lhe sentindo e lhe vendo em todos os lugares por onde possa andar, nas cidades visitadas, nas florestas por onde andar, sentir seus passos em meu caminhar.

Ter você sempre dentro de mim.

Parabéns, tenha um dia, um ano, tenha seus 32 anos de muita felicidade, que o amor lhe envolva sempre trazendo dias luminosos e sorrisos descabidos, sorrateiros, genuínos. Te amo!!!

01 de maio - Aniversário do Ióri

Por Rose:

Moleque, que você acorde em um dia repleto de luz e harmonia, hoje é o seu dia! Feliz Aniversário. 

Aniversários, nascimentos, vida que passa, gente que envelhece e memórias necessárias que ficam.

Nos acostumamos a enrolar todos no mesmo saco, fica parecendo que somos siameses de corpo e alma.

Vocês quando no meu aniversário, mencionam seu pai e fica difícil de separar você Ióri, da Cora, seja pela proximidade do dia de nascimento, seja pela proximidade corporal, mental de uma grande parte da existência de vocês.

Pensar nesse crescimento juntos, com tamanha cumplicidade, é necessária uma reflexão. Já estivemos em melhor sintonia, distanciamentos tendem a corromper a intimidade, liberdade, confiança e representatividade das pessoas em nossas vidas.

Estar mais velha e ter percorrido e experimentado um tempo vivido em suas diferentes idades, regado por conquistas, tristezas, alegrias, tédio, solidão, saudades e outros sentimentos controversos que não sabemos como explicá-los ou mesmo sabermos se são inventados. Mas com certeza são sentidos.

Ióri, em você pude experimentar o primeiro amor que pode enlouquecer, um filho inesperado, mas desejado. Inesperado pela pouca probabilidade reprodutiva e desejado por muito querer e saber que vocês viriam (aí misturou de novo). Com você foi uma deliciosa supressa saber que uma vida seria em mim gerada.

Você foi extremamente amado, com tamanha dedicação, que pode ter ficado um pouco estragado, não mais, pela minha liberdade e alegria em compartilhar todos os encantos vividos com você e querer logo outra pessoazinha em nossa família. 

E assim estamos em aprendizado e vivência por 34 anos, sempre na expectativa de que teremos maior oportunidade para ficarmos todos juntos, poder lamber a cria, dissimular a resistência de um abraço apertado e demorado, conversar prolongadamente assuntos inesgotáveis. E claro, sempre regado a uma boa comida e um bom vinho, uma mesa alegre, compartilhada e comprometedora. Quem sabe um bolo com velinhas com uma entusiasmada música de Parabéns para Você. E com uma família já maior, hoje já temos a Vanessa e o Luis somando ao amor que nos envolve como família.

Ióri, meu filho, posso falar meu menino, quanto amor tenho por você, como gosto de você, é um sentimento tão profundo que transborda pelos olhos, causando uma deliciosa sensação de conforto por saber que você está aí e que também me ama muito. 

Te amo muito moleque e lhe desejo toda leveza que a vida possa proporcionar ao humano, vida é isso, leveza, sabedoria e bem-estar da alma e do corpo. Que você seja comtemplado com isso em seu máximo de tempo das horas vividas.

Por Cora:

Desde os pés mastigados das minhas barbies a incorporarmos os monstros às brincadeiras, toda a nossa infância simbiótica em Lins a morarmos juntos sempre com tanta harmonia, viajarmos juntos ao Uruguai e sempre nos divertimos tanto, com toda a leveza e carinho! sempre falei por aí que você é umas das melhores pessoas que conheço! cuidando tanto de mim, de nós, da vovó, das nossas tias, e agora faz parte da sua profissão cuidar de quem precisa. como a mamãe falou, que falta faz assoprar um bolo juntos! um de morango bem gostoso que a fernanda fazia, um brownie da mamae, um peixinho na folha de bananeira do papai. espero que hoje você seja muito bem cuidado, amado, abraçado com todo o amor físico que não podemos te dar! e que fique esse nosso amor registrado virtualmente, cheio de saudade e orgulho de você e da nossa família por nos encher das melhores memórias possíveis!

Por Joca:

Filhote amado. O que mais sobrou para escrever para você além de que amo muito e que lhe desejo tudo de bom não só hoje, mas para todo o sempre. Sempre pois ainda tem muito tempo para frente e desejo que você tenha a mesma felicidade que tivemos em ter você. Sempre incluindo o passado, que você tenha a sabedoria de olhar para trás e tudo o que possa ter lhe magoado um dia, sirva para destilar a resiliência necessária para as amarguras que possam ainda vir. Você é sábio. Sua alma é pura como as causas que defende. Temos muito orgulho de você.

24 de abril - Aniversário do Joca

Por Rose:

Pois é, hoje é um dia festivo para todos nós. Joquinha, sempre você, sempre nosso companheiro.

São trinta e cinco ou trinta e seis anos de boas memórias, uma convivência com arestas aparadas, lixadas, perrengues que mereceram ser perdoados e que não precisam mais serem lembrados. Vou me ater nas coisas boas que vivemos, foram 80% de todo convívio, saldo mais que positivo. Embarcamos em uma vida de total comprometimento, compromisso e muita cumplicidade. Aprendemos a viver juntos de corpo e alma por 24 horas, e sinto saudades quando você vai ao barbeiro, te procuro pela casa num sentimento gostoso por lembrar sua ausência.

Você tem uma ternura no cuidar que demorei para me acostumar e hoje gosto e sinto falta. Amar sempre te amei, passando por momentos pequenininhos de ira despertada, que acho, com a maturidade da relação esses momentos de ira se dispersaram trazendo a compreensão de um imenso carinho e percepção do quão é bom estar ao seu lada, dormir ao seu lado, acordar com as mãos se entrelaçando em um gostoso pronunciar de bom dia. 

O tempo passa e o que poderia virar uma entediante rotina, se transforma em uma paixão de prazer e contentamento, afetos que apertam o coração quando se pensa com amor nessa vida que conquistamos e caminhamos em eterna mudança, abrindo um mundo de novas experiências e sentimentos. 

Estamos em um contínuo despertar alimentando nossa alma em harmonia e bem-estar, embalados por uma felicidade que se renova a cada dia, a cada mudança que fazemos, e a cada decisão radical que tomamos nos aproximando sempre mais, embalando nossas vidas em um gracejo regado por conversas intermináveis acompanhadas por umas taças de vinho. 

É seu aniversário, posso lhe desejar as melhores coisas que o mundo possa proporcionar a uma pessoa, posso desejar a continuidade de nossos dias, de nossos despertares. Que começam com carinho ainda na cama, sempre em um dia lindo, quase sempre um céu azul que nos acompanha no café da manhã onde a conversa geralmente são seus mirabolantes sonhos. A tarde andamos juntos pelas ciclovias em que a paisagem se transforma a cada dia e termina com o brindar do pôr do sol em uma praia com mar deslumbrante, e agora temos também a companhia de um gato praiano. Estou toda inteira nos desejos que lhe dedico, que a vida nos mantenha assim, em boa companhia e com muito gosto por ela. Te amo muito!!!

06 de maio - Aniversário da Cora

Por Rose:

Pois é, e você veio para dar ainda mais diferencial a nossa vida. Somos um núcleo pequeno e desgarrado, cheio de personalidade própria, que berra, late, rosna, e se ama, harmoniza, confia. Estar todos juntos é sempre o auge do nascimento dessa família, ver nas expressões de vocês as mais diferentes reações de amor, censura... Expressões que vão se transformando com o tempo e ficando ainda mais meigas. O Joca reage meio estabanado tomado pelo ciúme tanto da cria como pelo da companheira, ficando um climazinho estranho no encontro, percebendo algumas faíscas nos olhares (nesse momento geralmente eu sou o alvo). Mas a idade conserta tudo pela vivência, passamos a compreender e aceitar melhor a diferença de cada um.

Somos uma simbiose bem ajustada de nossos ancestrais, que nos tornaram seres incríveis e resistentes em um mundo caótico, porém, se bem conduzido nos leva à estase de uma existência. E todos nós sabemos navegar bem e se lançar em busca dos nossos quereres.

É seu aniversário Cora, mas fica difícil de individualizar todo um nascer e crescer em que por muito tempo tudo fazia parte de tudo. Você é um elo que alimenta minha coragem e autoestima, um amor que depois de 31 anos me provoca dor física, emoção e muita realização. Como te amo menininha.

Como uma construção, temos um caminho pela frente, e tenho a certeza de que estaremos sempre em aperfeiçoamento do nosso entendimento, compreensão. Feliz aniversário!!! E uma linda vida pela frente!

Por Joca:

Não tenho muitas palavras pois não sou versado nelas, mas tenho muitos sentimentos, estes são naturais, intensos, coloridos e altamente emotivos, são pouco racionais. Se conseguisse traduzi-los em palavras, som, imagens, cores, sabores, seria uma profusão profunda para expressar o amor, o carinho, a sintonia, a admiração e tantos outros sentimentos. Não, eu não seria capaz de reduzir o que sinto por você em uma mensagem estática, mas pelos olhos, lágrimas, risos e sorrisos, eu conseguiria. Beijos imensos filhota, neste dia que marca, para nós humanos, o momento em que veio ao mundo, como materialização do amor de sua mãe e meu.

06 de maio - Aniversário da Cora

Por Rose:

Corinha, 30! Quebra de barreira para maturidade, um sentimento mais sólido, compreendido e fácil, se para o encanto, ser estendido e magnificamente degustado.

Se você hoje multiplica por 2 esse tempo, você tem 60 ou se eu faço uma dobra, fico com 30, poderíamos nos encontrar no tempo na mesma idade? Tinha 30 enquanto você nascia e depois de 30 anos bem vividos, proporcionados por você momentos genuínos em que o amor extrapolava para o inconvencional, experiência divina!

Me sinto protegida e amparada por você, acredito em uma sintonia que em um sinal de alerta, uma pode socorrer a outra, quase que intuitivamente. E ter você junto de mim nessa sintonia, significa eliminar o tempo e a distância, sabendo que tudo se torna possível, real, instantâneo.

Você é a Cora (“nem homem, nem mulher”), incondicionalmente você! Posso lhe chamar de minha querida (palavra estranha no meu vocabulário), mas que representa um sentimento carinhoso de pertencimento de alguém extremamente amada, adorada!

Você parece estar acima de todos os desejos que eu possa ter para você, eles parecem já estar determinados ou se construindo para em qualquer momento lhe surpreender. Que assim seja em toda sua vida, que você seja surpreendida pelos seus melhores desejos e que venham os anos, em que você possa navegar entre o sol e pesadas nuvens, despontado em outro continente, cheia de amor e esperança. 

O mundo lhe abraça e assim espero que seja em todos seus aniversários e que ele seja acompanhado de um eterno, alegre, amável e inimaginável simbiose da nossa existência! Te amo muito menininha, feliz aniversário!

Por Joca:

Em meio aos tempos sombrios, perceber a fluidez e suavidade de sua luz alegre nos encanta e traz confiança.

Em meio a choros e raiva, perceber seu sorriso é ouvir forças para harmonizar, confortar e sorrir internamente.

Seu aroma é um traço delicado e nos chama a semear flores, ao invés de reclamar dos espinhos

O tato de sua pele explica o quanto os espinhos são importantes para o contraste entre falas que parecem roucas quando na realidade nos chamam à razão da consciência e do amor.

Cora.

Imagem, sorriso, leveza e você é real.

Por Rose:

E a Cora, quem é ela? Um dia, seus amigos no discurso do ensino médio falaram: ''A Cora não é homem nem mulher... " Isso me intrigou, até hoje não consigo ter uma compreensão completa da afirmação. Já nasceu independente e foi extremamente difícil para ser parcialmente domada.

Com o tempo se transformou em uma doce menina, que de vez em quando rosna. Gosta da transgressão e se equilibra entre a i e a (i)responsabilidade. Pode ser perfeita para mim, porque é assim que a amo. Sinto saudades, por ela em seu descompromisso, ficar semanas sem me ver, entendo, tem coisas muito melhores para fazer nessa fase da vida. É bom ter prioridades!

Parabéns minha filha, por mais um ano de muita satisfação, sua presença remota já me deixa felizinha, já ameniza minha carência materna. Seja muito feliz, sempre!!! Te amo muito!!!

Por Cora:

Uma das minhas maiores alegrias é quando alguém me diz o quanto sou parecida com você. Seu compromisso com a vida, com sua família, com suas paixões; seu compromisso em me criar e ao

Ióri, junto ao papaizinho,

com tanta sabedoria, determinação e insistência - sei que eu, particularmente,

não fui tão fácil (lembro de você chorando a primeira vez que comi peixe e hoje

é um dos meus pratos preferidos). Já passamos muitos aniversários distantes -

já que a família inteira tem siricutico e está cada ano em um lugar-, mas

nessas datas a ausência física acaba pesando. Queria estar aí para te dar um abraço muito, muito apertado e uma lambida na cara; deixar você estralar meus dedos do pé,

ficar a noite jogando conversa fora bebendo mais vinho que deveríamos. Ao mesmo

tempo, tenho muito orgulho da vida que vocês nos ensinaram a conquistar e sei

que, geograficamente, estamos distantes, mas nunca me senti mais próxima de

você. Talvez por realmente estar cada dia mais parecida (apesar de ainda ter

muita estrada para chegar perto da mulher que você é, um tiquinho já me deixa

muito feliz). Tenho todo o amor, admiração e carinho por você, meus parabéns, não

são só pelo seu aniversário, mas pela forma como você tocou e toca a todos nós

(e todos à sua volta). Parabéns pelo seu ano, mamãezinha, parabéns por

deixar tudo nesse mundo infinitamente melhor, parabéns por tudo o que

você conquistou e ainda tem a conquistar. Eu te amo muito mais do que consigo

expressar e espero que o seu dia seja repleto de muito carinho físico, que

infezlimente não posso dar. 

Parabéns cheio de amor da sua filhinha

Por Rose:

Aiaiaiai!!! Quanto amor pode caber no coração de uma mãe. Sentimento insano, doido, realizador, apaziguador e muito, muito recompensador.

E falar desse amor é inesgotável, podem passar 29 anos (meu Deus!), ou quem sabe 50, 60, e creio que ele vá apenas se intensificando.

Hoje a construção de nossas memórias, proporcionada pela convivência está diminuindo, eu e seu pai nos pegamos falando mais de uma época até São Paulo, em que os encontros eram intensos, mas temos muito o que lembrar e nos emocionar, tudo retorna como um filme em nossa mente que alimenta o nosso prazer e alegria. Amo muito você menininha.

Por Cora:

Tenho lido muitas escritoras mulheres. Todas feministas, apesar dos livros não tratarem do "movimento" em si. Não tratam do movimento, mas o feminismo está na espinha de cada um deles, assim como está nas nossas, mulheres. Tratam do isolamento, da angústia, da imposta subserviência, da revolta, da dor, do estupro moral e físico, da invisibilidade que leva à luta.

Mas lutar é um privilégio: significa que tivemos as ferramentas pra entender o que está errado e as ferramentas pra reivindicar a mudança. Tivemos o privilégio do questionamento.

A luta não é um privilégio de toda mulher que sofre. E toda mulher sofre. E quem não é mulher não tem um grão da dimensão do nosso sofrimento, do deserto que caminhamos, queimadas, até o fim da vida. Assim como não tenho um grão da dimensão do sofrimento de outras, nem de todas, ou daquelas que o privilégio não alcança. Sobre elas não posso dizer, apenas ouvir. Ler.

Ler as palavras de uma mulher é um sopro nesse terreno muitas vezes solitário. Aprendemos a calar e a ouvir desde muito cedo… hoje isso vem a calhar. Na proporção das mulheres que ouvem, existem as que falam. Espero.

Hoje é feriado aqui (Berlin). Dia das Mulheres. Nos deram um dia pra falar, dentre os outros 364 em que precisamos gritar.

Minha mãe me ensinou a gritar, porque sempre a vi gritando - não nesse imaginário histérico que criaram sobre as mulheres, mas gritando nas ações, no não-conformismo, na dissidência, na subversão das regras e dos valores. 

Ela também gritava com a garganta, principalmente no truco. 

Cresci vendo minha mãe ser o que hoje luto pra me tornar. Tenho lido muitas escritoras mulheres porque minha mãe me ensinou a ouvir.

Nesse dia em que me "deram" espaço pra falar, vou usar pra agradecer. Obrigada, mãe, por me ensinar a amar, a rosnar, a nunca ceder. Por me ensinar a gritar com a garganta, a gritar com os atos. Por me ensinar o privilégio da luta. Por me ensinar a descobrir, a viajar, a aprender. Por me ensinar que ser mulher é arder, mas também brilhar. Se hoje entendo a força desse amor feminino é porque você me encheu dele.

Obrigada por me ensinar a transbordar

Por Rose, para Joca:

Envelhecer a cada ano, às vezes gostaríamos de parar o envelhecimento e deixar o tempo rolar, se enrolar nele, andar, viajar, amar e também brigar, fazer as pazes. Viver é muito bom, envelhecer nem tanto, ou melhor dizendo, depois de uma certa idade é (como dizia seu avô) foda!

Ainda estamos em uma boa idade, já rompemos a primeira parte da nossa vida útil, mas ela ainda pode ser bela! E o melhor de tudo, ainda temos muito o que conquistar, aprender e a se aventurar.

Foram muitos aniversários ao seu lado, hoje estou fisicamente distante, mas totalmente grudada em você, te amo muito e meu desejo para você hoje, é, que você se encontre plenamente confortável, seguro e feliz junto de mim e de nossos filhos! Beijos.

Por Cora:

Encho a boca de orgulho toda vez que falo sobre meus pais. Deve até cansar às vezes, mas realmente acho que eles construíram uma vida incrível.

Até chegarmos em São Paulo, em meados de 2000, moramos no Rio, Petrópolis, Ribeirão Preto e Lins. Em cada uma dessas cidades nos mudamos algumas vezes de apartamento. Toda a família teve o privilégio de experimentar novas culturas. Todos nos coçamos depois de determinado tempo em um mesmo lugar.

Pouco depois que me mudei pra Berlin, meus pais concretizaram um de seus grandes planos: voltar a viver com o pé na areia (foi literalmente assim que se conheceram).

ENFIM, eles largaram São Paulo e se jogaram na Bahia, Praia do Forte. Não fosse o bastante, acabam de lançar um site, criado do zero, com dicas, histórias e fotos lindíssimas do lugar que agora chamam de lar (pelo menos até começar a coçar).

Olhem que coisa mais incrível: https://www.velhospqp.eco.br/home

Parabéns, por mais essa conquista maravilhosa!

"Sempre que voltamos em nossa história, vamos falar de exploração, escravismo, perseguição à indígenas... Na Praia do Forte não é diferente."

Por Joca, para os filhos, em 

O que podemos deixar para os filhos além dos exemplos? Que podem nem ser exemplares perante às regras da sociedade, mas que, no nosso entendimento, seriam plenos de princípios e coerência. Podemos deixar também a empatia, porque afinal, todos os pais que se prezam como pais, têm empatia com quaisquer ações dos filhos. E daí derivaria a compreensão. A compreensão de tentar compreender sem necessariamente ser compreendido. Mas certamente, ter os olhos abertos para ver que existem outras realidades além destas que enxergamos. Pode ser que nem sequer compreendamos que sejam outras realidades, mas que existem como tal em nossa limitada forma de tentar compreender os outros e que temos que respeitar.

Bem, além de entender que todos tem os mesmos direitos de pensar e ser diferentes de nós, existem também as relações. As relações familiares, fraternais, sociais e amorosas. Familiares, eu e Rose, discutindo sobre o documentário do Gil e família (aquele da turnê na Europa com todos os familiares) entendemos que todas as famílias têm uma âncora, a do Gil, é o Gil, sua poesia, seu amor, sua paz, todos, independentemente das divergências, convergem para esta âncora. D. Elza é uma âncora, D. Lucy foi uma outra âncora, e assim vai. Estas relações se constroem pelo compromisso, pela sintonia e afinidade com uma âncora comum. Por mais diferentes que sejamos, existe uma convergência em uma família que se encontra em valores comuns. O compromisso tem que existir, mesmo que sejam dois compromissos concomitantes para as duas famílias de um casal. Isso deve partir do casal. O compromisso é, e está em ser, e puxar a outra parte, e ser puxado pela outra parte, para aquilo que importa nos laços familiares. Isso é muito bonito no documentário do Gil. Divergências? Claro que existem, mas os princípios têm que ser visualizados e priorizados.

Nisso vem o ponto primordial. Estamos velhos e calejados, infelizmente, existe aquele ditado sobre conselhos. Daqui a dois dias (28/07/22) estaremos fazendo 34 anos de casados. Muitos desencontros e frustrações mútuas, mas, acima de tudo, muito amor, muita sintonia primordial e muita construção sobre as divergências. Somos diferentes um do outro? Sim. Sentimos e compreendemos as situações diferentemente um do outro? Sim. Mas apesar de não impormos nossa forma de ver e sentir, cobramos um do outro a coerência dos sentimentos, dos laços, do compromisso enfim.

Sobre estes pontos, sobre as âncoras familiares (olha, mesmo que não existam famílias, as âncoras seriam arquétipas) sobre a relação do casal, sobre o respeito mútuo e compromisso um com o outro, vem a construção, o foco com a educação, com a cultura, com a percepção sensorial, artística, social e humana.

Enfim, não sabemos o que acontecerá a partir daqui. Mas o que desejamos e o que importa é que vocês encontrem uma luz, uma sintonia, um querer comum sobre o qual consigam construir um futuro.

18 de setembro - Aniversário da Rose

Por Ióri e Cora:

Mamãezinha,

Aqui vão 600 gramas de queijo (ou por aí... quem está contando?) para seus 60 anos de vida (esses sim, contados). Caramba. Suas duas crias te mandando uma caixa daquilo que faz falta, já que nós mesmos não podemos nos enviar pelo correio. Aqui vão duas garrafas de vinho. É um presente que dispensa motivos, mas se precisássemos dar, seria 1o: porque você já tem os copos apropriados e 2o: pela (já batida) analogia entre vinho e idade, "fica melhor com o tempo" - mas não dessa maneira fácil que a licença poética permite: não é qualquer vinho que envelhece bem. A uva colhida e pisoteada precisa ser boa. O processo cuidadoso, assim como o armazenamento. Você foi colhida ali na terrinha de Minas e já começou bem, visto que é uma das melhores regiões para cultivo (de gente e de frutos). E, desde que ganhamos o dom da escuta, ouvimos suas histórias de uma infância digna de um livro do Gabo, desde árvores com cobras até estilingues humanos de bambu. Também ouvimos o quanto você aproveitou cada momento da sua vida, sem precisar recorrer à nostalgia. Do pisoteio à taça, você fez com que cada etapa fosse bem vivida, buscando os temperos mais exóticos, nos mais diversos locais do mundo. E nos ensinou a ver o passar do tempo assim, construindo um futuro e sorrindo para o passado - achando o presente o melhor até então.

Nosso presente para você também é esse: seus filhotes no melhor presente que presenciaram até agora. Com melhores por vir e sorrindo para os que já foram. Que esse seu novo ano também seja o seu melhor! 

Te amamos com todo o amor que cabe no peito e desejamos um aniversário espetacular!

Beijos para você e o papai,

Seus filhotes.

Por Ióri e Cora em 18 de outubro:

Hoje bisbilhotando a página do Ióri (filho) me deparei com esse texto. Incrível como as reflexões feitas por ele se tornaram tão reais, isso quase 3 anos depois. Agora um luto amordaçado!!! Ióri, muito feliz por encontrar seu texto nesse momento, copiei, porque você permite no seus comentários. Obrigada!

Por Ióri em 29 de outubro:

Hoje estou de luto, e visto preto.

Não porque a democracia tenha morrido, ela vem definhando há anos. Cada eleição que passa, com propagandas enganosas, notícias falsas, propagandas que valorizam o ataque pessoal; a democracia sofre. E por culpa de todos os partidos e todos os candidatos.

Mas o nosso presidente ainda foi eleito democraticamente. Se houve ou não ataques as leis que regem a eleição, que por acaso anulem a decisão do povo, cabe ao futuro mostrar. Isso não é importante agora.

A eleição desse presidente foi alavancada por ódio e medo.

Medo da continuidade de uma decadência econômica, medo de ver seu salário valer cada vez menos, sua empresa falir, sua dívida crescer; medo de ver seus filhos desempregados, seus parentes doentes e sem cuidado...E ódio daqueles que vemos como culpados por nosso sofrimento, aqueles que guiaram nosso país nos últimos anos.

No meio do medo e ódio, uma coisa muito mais importante que a democracia morreu. Morreu nossa empatia.

Se você tem medo do que pode acontecer, há pessoas que tem pavor da possibilidade do que já aconteceu se repetir.

De ver novamente seu namorado(a) ser espancado por estar de mãos dadas com você -um(a) homossexual-;

De ver novamente seu chefe te assediando, impune porque é você -uma mulher;

De ver novamente suas mãos algemadas sem motivo, além quem é você -negro;

De se ver atrás de grades por conta de suas ideias, e sua família não saber onde está você -oposição-;

De ver suas terras tomadas, e não ser capaz defende-las, pois o Brasil esqueceu de você -indígena.

De ver sua existência ser negada, como se sua mente não tivesse capacidade de saber quem é você -trans

E é inegável que o presidente eleito evoca essas lembranças. Nos seus discursos. Nas suas entrevistas. Nas suas promessas.

E você, que o elegeu, pode dizer que isso nunca vai acontecer, que não haverá escalada de violência ou desrespeito às minorias (das quais citei apenas uma parcela), que o Brasil não será tomado pela barbárie. Mas nem você, nem eu, iremos sentir o medo que essas pessoas vão sentir todo dia, o medo provocado por ver como símbolo do país uma pessoa que as lembra de tudo que já ocorreu de pior nas suas vidas, e de saber que esse mesmo pensamento dele foi validado pela maioria da população, que afinal, o elegeu.

Então não comemore a eleição do presidente, não force o seu slogan – Brasil acima de tudo, Deus acima de todos – na visão de todos que o circundam. Pois o Brasil deve ser de todos, e, se há um Deus, ele está entre, e não acima, de nós. Estenda sua mão, e se receber um espinho, entenda que a dor desta picada é ínfima perto da dor que provoca a reação. Mas se alguém aceitar sua mão, aceite que ela seja erguida, e adicione seu grito pela defesa daqueles que sentem medo como você nunca será capaz de sentir. Se alguém o chamar para apoiar sua existência, se junte a resistência, seja uma presença de oposição a todo o preconceito que esse presidente representa.

Hoje eu estou de luto, pois a empatia - algo muito mais básico que a democracia morreu-; e visto preto, para que um dia todos possam usar a cor que quiserem, sem ver nas sombras medos do passado.

Gênesis, a origem

Talvez nenhum outro livro carregue um título tão apropriado para presentear uma mãe. A origem.

O belíssimo trabalho de Sebastião Salgado é fruto de uma busca do fotógrafo em homenagear a natureza, "um hino visual à grandeza e à fragilidade da Terra”. A conveniência do tema não foi à toa, pois esse livro foi a forma que encontramos para homenagear também nosso mundo e sua origem.

Você, mãe, é a representação máxima do Gênesis, o retrato perfeito da magnitude do mundo em roda sua beleja pura e bruta - desde o musgo de seus olhos à sinceridade de seu sorriso.

É você nossa Terra eterna, mãe, e esse é nosso hino à sua grandeza.

Te amamos muito, além do limite que suporta o coração. Parabéns não só pelos anos de vida, mas pela beleza e perfeicão de seu ser - como amiga, como profissional, como mulher e como mãe.

Beijos lambidos e babados,

Cora e Ióri

Por Tio Tão (Antônio Carlos Leal Gastão), em 14/08/1991 para o Ióri:

Se tudo continuar

tão certo como é agora

o teu futuro não tarda

a te dizer bom dia.

Repousa um pouco, então,

e deixa de franzir a testa, garoto.

Olha de ponta-cabeça

as besteiras na televisão.

Que besteira dar conselhos...

a gente fala

e no fim dá no que der...

É querer dar nuvens

à forma.

Por Tio Tão (Antônio Carlos Leal Gastão), em 14/10/1990 para o Ióri:

ATRÁS DELE

Atrás dele espia um olho,

um duende arteiro,

um boné de saci,

um vento redimunho,

uma história de índios

que conta como o Sol

mergulhou no mar pra ferver a água,

virar nuvem,

mergulhou no chão pra fazer chumbo,

ouro, queda d'água.