A insustentável duração do ser

Maria Adriana Svacina


Desde muito tempo, meu inconsciente me acorda quase todos os dias com uma música. Vai de Cartola à Nirvana, de Lamento Sertanejo à Mother. É muito mais prático e eficiente do que sonhos que nunca lembro bem (o que, aliás, endossa a otimização me-engana-que-eu-gosto do meu aparelho psíquico).

Pois bem, hoje foi a vez de Cazuza com as ideias que não correspondem aos fatos. E, atrelado a isso, como vem bem a calhar ao nosso tema central, o tempo que não para. Acredito que a rebeldia, que sempre acompanhou essa e outras músicas do menino que só queria ver o pôr do sol na praia, veio me lembrar da minha própria rebeldia, hoje enfiada em um armário cheio de tralhas, daqueles que, se abrir a porta, cai tudo. Ou pelo menos, essa é a impressão que o receio imprime.

Logo eu, aquela que vive dizendo que os outros, aqueles do inferno, somos nós mesmos. Mas parece muito difícil manter a poesia da rebeldia com o passar dos anos. Manter a atitude já é um pouco mais fácil. Vejo muitas pessoas cheias de admirável atitude, em geral atreladas a uma causa qualquer, seja ligada à natureza, à política partidária ou à condição humana, por exemplo. Mas sou descrente, até das causas. São 57 anos no país do futuro que nunca chega, até o momento em que se percebe que o futuro nunca chega mesmo. Fazer o quê? Brigar com Einstein? Além do que, a atitude é sempre louvável. Até dar de cara com a rebeldia. Então é fincar o pé no chão e daqui não saio! É chutar o balde e fazer o que der na telha. É ser inconsequente. Aí não! Aí já extrapolou, né minha filha?

E enquanto escrevo, a melodia vem e volta, o refrão aparece em letra e fico aqui cantando, de frente para o computador: “Eu vejo o futuro repetir o passado. Eu vejo um museu de grandes novidades. O tempo não para.”